Estórias Do Nosso Mundo
O flamingo rosado: a foto enviada por R. Silva relembra a desditosa ave
Está a suceder aquilo que os mais avisados previram há muitos anos.O flamingo-rosa, a ave pernilonga das lagoas do Lobito, praticamernte está a desaparecer. Com desenvoltura e simpatia, o flamingo conquistou, por mérito próprio, o direito de ser o símbolo da cidade, o seu “ex-libris”. Sem ele, a urbe está a perder um dos traços mais marcantes da sua graciosidade.
Poisados ou voando em grupos, os flamingos eram facilmente encontrados nos mangais e lagoas do Compão e da Caponte. A visão da ave proporciona um espectáculo de singular beleza e curiosidade. Trata-se de uma criatura arredia, coberta de uma penugem rósea que lhe cobre o corpo precariamente sustentado por dois caniços longos e aparentemente frágeis. A cabeça se encontra na extremidade superior do pescoço sinuoso e de traçado harmonioso, com a forma de um ponto de interrogação. Depois surge o bico adunco habitual nas aves de rapina, encimado por duas missangas pretas nos orifícios nasais.
Muita gente desconhece como surgiram os flamingos nesta zona. O Lobito é uma cidade de águas interiores. A foz do rio Catumbela, à Sul, é irregular. Em época de ocorrência de cheias, o delta do rio ramifica-se. Aluviões criam novos braços do rio que, desde sempre, chegaram até ao Lobito Velho. No seu percurso, deixaram lagoas, que se foram interligando. São os chamados mangais, devido a floresta de "mangues" que ali se criou. Dadas as características do terreno, as lagoas permaneceram em movimento sincronizado com as marés. Mantidas com vida, as águas foram povoadas por peixes que atraíram um leque de aves aquáticas, como pelicanos, garças e os flamingos, que ali passaram a dispôr de alimento.
Tacitamente, existia um pacto de coexistência pacífica entre o homem e a colónia de flamingos. O frágil pacto agora se está a quebrar. A causa é que o Homem e o flamingo disputam um espaço vital comum, os tão cobiçados terrenos do Lobito. Os mangais da Caponte e do Compão com os seus peixes, flamingos e garças, ocupam terrenos financeiramente valiosos e apetecidos para os projectos imobiliários que estão em voga, como os condomínios onde os iluminados pela estrela da sorte se irão aboletar.
Quando perguntamos como ficavam os flamingos, responderam-nos que a cidade tem de crescer para responder à demanda. E para a cidade crescer, elanecessita de espaço. Quem conhece o Lobito, saberá certamente que, em termos urbanísticos, a parte baixa da cidade tem severas limitações de espaço. As lagoas, após drenagens e devidos aterros, são o local ideal para implantar novas florestas concreto, pretensos simbolos de modernidade e de progresso. Na hora de demarcação de fronteiras acaba a complacência para com a desditosa ave.
Desde há muito o flamingo pareceu entender o perigo envolvente. Existiram alturas em que as aves praticamente haviam debandado do local. Devido a realização de obras de circunstância, o canal de ligação das lagoas com as águas da baía, tinha ficado bloqueado. As águas ficaram putrefactas, emanando um cheiro nauseabundo que se espalhava por toda aquela zona. O ecossistema local alterou-se a tal ponto que, tanto a flora como a fauna marinhas começaram a desaparecer, e com eles seguiu também o flamingo rosado.
Nos lembramos perfeitamente de um passado não muito distante, quando a ave pernilonga foi caçada à fisga e à bala por militares inconscientes, durante o conflito armado. Houve até quem lhe tenha provado a carne, segundo nos informaram.
É fácil prever o resultado de uma batalha entre o insaciável bicho-homem, com suas “bulldozers” e basculantes e o indefeso e frágil flamingo que unicamente reclama o direito de existir como um elemento da Mãe-Natureza. A cidade continua a crescer. A cidade tem de crescer.
Mais uma vez nós aproveitamos para perguntar: será que dentro do plano director de desenvolvimento do Lobito, a sobrevivência do flamingo não poderá estar salvaguardada? Pensamos nos condomínios, nos estaleiros, na refinaria, nos caminhos-de- ferro. Tudo bem.
Mas, será que já não é possível partilharmos o espaço com as outras espécies do nosso Único Mundo?
3 comentários:
No futuro virão os lamentos, as maledicências e a critica fervorosa e fácil, mas no presente, de modo estranho(ou nem tanto) parece que a fábula dos três macacos se repete inexoravelmente. Não bastaria a criminosa ocupação/utilização dos terrenos da açucareira, de alta apetência agrícola, com acessos, abastecimento de água e canais de irrigação como outros não havia no litoral angolano, para agora surgir mais esta triste e já repetitiva história de malfeitoria ambiental. Pareces um pregador da IURD no deserto do Nimbe o que só por si já seria dramático e lamentável, não fossem as consequências...Dizia um conhecido jornalista inglês que o dever maior de um jornalista é levar para casa um salário ao fim do mês......daí se entendam tantos silêncios.
Nando
pois é no final ficam somente lamentações mas há ainda algo a fazer e a ser feito pelo flamingo especie rara que irradia beleza e q faz parte de uma atracção turistica que devemos cuidar .e como tudo é possivei acredito que dias melhores viram e que o flamingo ainda sera uma espécie protegida e apreciada do ponto de vista turistico por mta gente....
DEPOIS QUEIXAM-SE DAS CRISES QUE ELES PRÓPRIOS PROVOCAM!
No seu sorvedouro a lógica capitalista não tem contemplações, nem para o homem, nem para a natureza.
O que me parece preocupante são as entidades oficiais angolanas não meterem mão, a fim de evitar-se, neste caso, o que parece irreparável.
Onde anda o Ministério do Ambiente?
Onde estão as autoridades locais?
Martinho Júnior.
Luanda.
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