domingo, 4 de abril de 2010

En Cuba... Con Fidel (II)


     Numa tarde de  Março fotografei próximo de Colón, numa estrada que liga Matanzas à Cienfuegos, este grupo de trabalhadores rurais participantes na campanha de corte de cana-de-açúcar, la zafra, uma das actividades mais emblemáticas do país caribenho. Duas bandeiras drapejam ao sabor do vento verspertino que deixa no ar o aroma do melaço queimado. Uma, a bandeira nacional, branca, azul e vermelha e a outra, a bandeira da emulação socialista"-Por favor amigo, puedo cojer una foto de usteds?" - "Coja quantas quiera y mira, venga tomar algo com nosotros". É assim a hospitalidade cubana, agradeci. Estava entre os homens do campo, os soldados fiéis  que garantem a sobrevivência do regime socialista de Cuba. São eles que ganharam com a revolução e têm Fidel como um verdadeiro Deus.
       Em 1959, quando triunfou a guerrilha de 2 anos comandada por Fidel a partir da Sierra Maestra, El Comandante adverte: "Esta revolucion es una revolucion de los obreros y los campesinos ". Logo proclama a Reforma Agrária. Confisca propriedades que estavam maioritariamente na mão de grupos americanos ou deles próximos. Para atestar a  seriedade do processo reformador ocorreu um acto simbólico de proporção inimaginável: Fidel ordena que a primeira fazenda a ser desapropriada seria justamente a da  família Castro, com cerca de 14 mil hectares na província oriental de Holguín, o que obrigou a senhora Lina Ruz, mãe dos dois revolucionários mais poderosos do país, a exilar-se no México. Deixaram de existir dúvidas, se ainda as houvesse. A Reforma Agrária tinha vindo para ficar. Assim começaram as makas com os "yankes", os poderosos vizinhos do Norte, detentores de um longo rol de acções de hostilidade contra Havana e sobretudo contra o sistema personalizado pelo visionário Fidel e seu enigmático irmão Raul, hoje na chefia do estado. Os sucessivos presidentes americanos, desde o velho general Eisenhower herói do desembarque da Normandia que expulsou as forças hitlerianas da europa, passando por John Kennedy até ao candidato à profeta Hussein Barack Obama são sistematicamente obcecados pelo problema cubano, como se fosse uma espinha atravessada na sua garganta. Incluem-se os Nixon, os Reagan, os Bush pai e filho e mais alguns. No inicío dos anos 60, McGeorge Bundy, assessor para questões de segurança nacional do presidente Kennedy tinha três caixas para correspondência no seu gabinete de trabalho na Casa Branca. Uma para as mensagens recebidas, uma para as enviadas e a terceira para as mensagens de Cuba. Os EUA prepararam e apoiaram, em Abril de 1961 a invasão da baía de Playa Girón (antiga Baía dos Porcos) rechaçada por Fidel e seus homens barbudos. Seguiu-se, em Outubro de 1962 a crise dos mísseis s soviéticos instalados em Cuba e uma guerra nuclear esteve à beira de rebentar entre a URSS e os EUA. Depois disso inúmeros planos foram orquestrados pelos operacionais da CIA para matar o líder cubano, sem êxito. Os EUA (sempre eles) mantêm até aos dias de hoje um bloqueio económico contra a ilha e têm em Guantamo uma base militar onde estão confinados os acusados de terrorismo. Para se tentar entender a raiz de tão forte raiva contra Cuba vale a pena recuar o relógio da história.  A República de Cuba foi proclamada em 1902, na sequência da derrota militar dos colonizadores espanhóis frente a uma invasão americana, no dia 10 de Dezembro de 1898, ao que seguiu o tratado de Paris que permitiu aos "yankes" instalarem um regime militar por um período de quatro anos. Depois disso os EUA pressionaram a assembleia constituinte cubana a incorporar um apêndice à Constituição que deu aos americanos o direito de intervirem nos assuntos internos da ilha. Foi a chamada "Emenda Platt" que limitou a soberania e a independência de Cuba durante 58 anos, até à queda do regime de Fulgêncio Batista. Em 1 de Janeiro de 1959 uma força guerrilheira comandada por Fidel Castro, o seu irmão Raul, o lendário Che Guevara e Camilo Cienfuengos derruba Fulgêncio e proclama a Revolução Popular. A partir da data os cubanos pensam que o desejo dos EUA é voltar a dominá-los tal como aconteceu no passado.

     Um dos principais símbolos da influente presença do poderoso vizinho do Norte na ilha de Cuba vem das primeiras décadas do século passado. O Capitólio, obra inspirada no famoso Capitólio de Washington, nos EUA. Começou a ser construído em 1926 por 5 mil trabalhadores e levou três anos para ser concluído. Custou 17 milhões de dólares na época. Malfadado imperialismo que tira o sono a el comandante Fidel

      Meio século depois, nesta tarde de Março de 2010, estou eu, cidadão angolano oriundo das praias de Benguela,  tomando  refresco com os filhos e netos dos primeiros beneficiários das medidas anunciadas pelo comando rebelde chefiado por Fidel Castro. Na conversa rapidamente dou conta que eles não representam o standard do trabalhador rural da américa latina, geralmente assalariados das herdeiras da tristemente célebre United Fruits ou serviçais analfabetos de latifundiários déspotas. O nível cultural do cubano campesino é notoriamente alto. As campanhas de alfabetização decretadas pelo governo revolucionário mal tomou o poder eliminaram completamente o analfabetismo na ilha que atingia os 41,7% da população rural. A educação é altamente controlada pelo estado e a constituição cubana determina que o ensino básico, o médio e o universitário são gratuítos. Os filhos desses camponeses acedem sem dificuldades às universidades, sem que tenham que pagar nada, mas só podem fazê-lo após o cumprimento do serviço militar. Mas até ao 9º ano todos os cubanos são obrigados a estudar. Os nacionais acedem gratuitamente aos serviços de saúde, considerados de boa qualidade face aos padrões mundiais. A expectativa de vida para os homens é de 75 anos e para as mulheres sobe para 79.
      Estou com os trabalhadores rurais, los macheteros, os respeitados cortadores de cana (Fidel e Che arregaçavam as mangas dos uniformes e cortavam cana com eles nas primeiras zafras após o efusivo  triundo da revolução). Converso com condutores de tractores e de camiões com mais de meio século de trabalho. Estamos bebericando refresco, numa tarde ensolarada em Colón, na minha travessia para Cienfuengos. O meu plano é seguir depois para Santa Clara, a fim de visitar o monumento à Che guevara. Evito fazer muitas perguntas. Estou na ilha na qualidade de turista e não como repórter credenciado pelas autoridades. Quando se está em casa alheia é bom respeitar as regras, sobretudo quando somos bem recebidos. No entanto, Cuba revela sempre um caso especial de amor. A própria ilha, os acontecimentos passados e actuais que ela encerra, nos fascinam irremediavelmente. Nos enlaçam e deles não conseguimos fugir com os nossos sonhos, apesar das críticas e dos problemas que surgem.
     No mês de Março de 2010, um pouco antes até, estalou o problema da greve de fome que culminou com a morte do conhecido dissidente preso Orlando Zapata, com repercussões por todo o mundo,em matéria de direitos humanos. Cuba foi censurada e enfrenta ameaças de sanções por parte da União Europeia, de quem depende para  o relançamento da sua indústria turística, uma das saídas para salvar a economia da ilha, após o fim do suporte que era garantido pela ex-URSS. Para agravar a questão, seguiu-se depois a greve de Guillermo Farinas Hernandez, um antigo coronel das Fuerzas Armadas Revolucionárias (FAR), conhecido pelo apelido de "Coco" e que tem constituído uma verdadeira dor de cabeça para o regime cubano desde o início de 2010. Farinas mantém-se em greve de fome na sua residência em Santa-Clara tentando conseguir a libertação de 20 antigos companheiros mantidos presos por actividades considerada contra-revolucionárias pelo governo. Da sua casa, o antigo coronel, formado em psicologia dá permanentes entrevistas à emissoras de rádio e televisão que são estampadas em Miami e no México, com grande efeito mediático no seio dos emigrantes cubanos fugidos da revolução. Os jornais oficias de Cuba não tratam o assunto, com excepção de um editorial do Granma que acusou o grevista de estar a soldo da Repartição dos Estados Unidos em Havana. Mas os comentários vão se alastrando entre a população e todos conhecem a história do coronel das forças especiais das FAR que tem na sua folha de serviços duas missões internacionalistas em Angola no tempo da guerra.

2 comentários:

Anónimo disse...

Parece que não querias voltar.....
Gostei da escrita , lembrei as minhas viagens por lá.Está bem melhor agora apesar de tudo.No tempo do "puro e duro"nem dissidentes nem "contras" tinham a mais pequena possibiidade de protestar.
Nando

Anónimo disse...

ADOREI AS FOTOS, SO NAO ME CAIU BEM UMA DAS FRASES QUE VOCE ESCREVEU USANDO A EXPRESSAO "MALDITO IMPERIALISMO" QUANDO TE REFERIAS A UMA CONSTRUCAO SIMILAR AO CAPITOLIO AMERICANO,ESTE IMPERIALISMO ESTA EM ANGOLA COMO E:ANGOLA NESTE MOMENTO E UM DOS PARCEIROS DESTE IMPERIALISMO...SERA QUE ESTAMOS NUM BOM CAMINHO?
MELHORAS E QUE CONTINUES NESSA BATALHA