Quinta-feira, 28/01/10. Um dia memorável para os adeptos de futebol que lotaram as bancadas do Estádio Nacional de Ombaka. Nada mais nada menos que as selecções de futebol do Egipto e da Argélia estavam no lindo relvado para discutirem a vaga para a final do Campeonato Africano das Nações que Angola organizou pela primeira vez na sua história. 20h30. O ambiente no estádio era extraordinariamente electrizante. As duas claques foram direccionadas para bancadas opostas.
Os encontros de futebol entre os dois países do Magrebe têm redundado em verdadeiras crises diplomáticas entre Argel e o Cairo. Estava em causa uma velha dívida a ser saldada, o ajuste de contas de uma longa disputa que remonta aos anos 50 do século passado e que teve o seu epílogo recentemente, num jogo extra disputado em Cartum, no Sudão, no apuramento para o mundial da África do Sul. Quando terminou a fase de grupos as duas selecções estavam tecnicamente igualadas, de tal forma que ficou por terra a possibilidade da aplicação dos habituais critérios de desempate nos jogos disputados e no número de golos marcados e sofridos. Ambas tinham 13 pontos, 5 golos de saldo e 9 a favor. No confronto entre si estavam igualmente quites. Por decisão da FIFA houve que disputar um jogo-extra em terreno neutro. As equipas foram notificadas para escolherem, cada uma, o terreno para a grande batalha. O Egipto escolheria a cidade de Cartum, capital do problemático vizinho do Sul, com a esperança de que as águas do mítico Nilo que banham os dois países levassem sorte aos seus jogadores. Por seu turno, os argelinos optaram por apresentar na proposta a cidade mediterrânica de Tunis, na vizinha Tunísia. Por sorteio, Cartum ganharia a primazia de albergar o histórico confronto. Jogou-se uma partida memorável com grande repercussão internacional, a beliscar as relações diplomáticas entre os dois países. Chegaram a chamar-lhe “o jogo do ódio”. A Argélia levaria a melhor no Sudão e assim ficou entre os competidores da Copa do Mundo a disputar nas terras de Mandela, em Junho próximo. Para o Egipto não apurado, este jogo em Benguela era a oportunidade para a vingança e saber quem afinal manda em África. E no fim o resultado foi favorável aos "faraós" por inusitados 4-0, mas houve barraca e a Argélia terminou o jogo com quatro jogadores a menos, devido a chuva de cartões mostrados pelo árbitro do Benin.
Encontros e desencontros magrebinos
Nos últimos três meses os dois combinados nacionais defrontaram-se por três vezes. No entanto, o histórico de encontros e desencontros políticos e desportivos com fortes incidências nas relações entre as duas nações, remonta aos anos 50 do século passado. Os nacionalistas argelinos combatiam a ocupação francesa do seu território. Um grupo de futebolistas argelinos que actuava em clubes franceses decidiu abandonar as suas equipas e formaram uma selecção para divulgar, por meio do futebol, a causa do movimento independentista da Argélia liderado pela FLN (Frente de Libertação Nacional). Esse “time” defrontou selecções de vários países. O Egipto rejeitaria, entretanto, jogar com eles. O mesmo Egipto que, sob a liderança de Anwar-El-Sadat assinaria com Israel os acordos de paz de Camp-David, em 1978. O reconhecimento de Israel por parte do Egipto despertou uma onda de ódio no mundo fundamentalista islâmico. Pouco tempo depois Sadat seria assassinado. Houve muita crispação na política da região e choveram acusações de cumplicidades. Este ambiente viria a transformar-se num cocktail de ódio que se derramaria no dia 17 de Novembro de 1989. Egipto e Argélia iriam defrontar-se em dois jogos que valiam uma vaga na copa da Itália. Na Tunísia o “placard” regista um rigoroso 0-0. A decisiva partida vai disputar-se no Estádio Internacional do Cairo. Estão presentes 120 mil espectadores, num ambiente de verdadeira loucura. Quando o Egipto se adianta no marcador, com um golo de Hossan Hassan, estala a confusão. Os argelinos cercam o árbitro e exigem a anulação do tento.O juiz não volta atràs e o Egipto vence por 1-0. Mais tarde, as imagens de televisão mostraram que não irregularidade no lance que decidiu a partida. Mas a confusão já se tinha instalado e prosseguiu depois do jogo. Num hotel do Cairo o médico da selecção egípcia ficaria sem um olho durante uma briga. Lakhdar Belloumi, estrela que brilhara no campeonato mundial de 1982 e considerado o melhor futebolista argelino foi indiciado como autor da agressão. Apenas em Abril de 2009 Belloumi seria inocentado, graças a intervenção do presidente Bouterflika. Mas o recalcamento, este continuaria guardado.
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